Eles respeitavam
a vida acima de tudo, escreveram os mais antigos textos
bíblicos e influenciaram o cristianismo. Com vocês, os essênios.
Por Rafael Kenski e Duda Teixeira
Em
1923, o húngaro Edmond Szekely obteve permissão para pesquisar
os arquivos secretos do Vaticano. Estava à procura de livros que
teriam influenciado São Francisco de Assis. Curioso e encantado,
vagou pelos mais de 40 quilômetros de estantes com pergaminhos e
papiros milenares. Viu evangelhos nunca publicados e manuscritos originais
de muitos santos e apóstolos, condenados a permanecer escondidos
para sempre. De todas essas raridades, uma obra em especial lhe chamou
a atenção. Era o Evangelho Essênio da Paz. O livro
teria sido escrito pelo apóstolo João e narrava passagens
desconhecidas da vida de Jesus Cristo, apresentado ali como o principal
líder de uma seita judaica até então pouco comentada
- os essênios. Szekely não perdeu tempo. Traduziu o texto
e o publicou em quatro volumes. Sentindo-se traída pelo pesquisador,
a Igreja o excomungou.
Não foi uma punição
tão grave. Considere o que aconteceu com o reverendo inglês
Gideon Ouseley. Em 1880, ele achou um manuscrito chamado O Evangelho dos
Doze Santos em um monastério budista na índia. O texto em
aramaico - a língua que Jesus falava - teria sido levado para o
Oriente por essênios refugiados.
Manuscrito achado
no
Vaticano afirma que Jesus
era essênio e vegetariano
Ouseley
ficou eufórico e saiu espalhando que tinha descoberto o verdadeiro
Novo Testamento. Afirmava que a Bíblia estava incorreta, pois Cristo
era um essênio que defendia a reencarnação e o vegetarianismo.
Se hoje essa tese soa estranha, dizer isso na Inglaterra vitoriana do
século XIX era blasfêmia da pior espécie. Resultado:
os conservadores atearam fogo na casa de Ouseley e o original foi destruído.
O mistério que envolve
esses dois textos e o tom místico que os descobridores deram aos
seus achados acabaram manchando seu crédito diante dos historiadores.
Além do mais, teorias exóticas sobre Jesus é o que
não falta. Em 1970, o pesquisador inglês John Allegro, que
já havia estudado os essênios, tentou provar que Jesus nunca
havia existido e que teria sido uma alucinação coletiva
causada pela ingestão de cogumelos. Por motivos óbvios,
essa teoria não foi muito bem aceita pelos seus colegas cientistas.
Segundo eles, Allegro entendia mais de cogumelos do que de Cristo.
Para os historiadores,
os essênios seriam até hoje uma note de rodapé na
História se, em 1947, dois pastores beduínos não
tivessem por acidente levado a uma das maiores descobertas arqueológicas
do século. Escondidos em cavernas próximas ao Mar Morto,
em Israel, 813 manuscritos redigidos pelos essênios entre 225 a.C.
Fragmento de um dos 813 manuscritos
redigidos pelos essênios entre 225 a.C. e 68 d.C.
E
o ano 68 da nossa era guardavam as mais antigas cópias do Antigo
Testamento, calendários e textos da Bíblia. Perto das cavernas,
em Qumran, estavam as ruínas de um monastério essênio
e um cemitério com cerca de 1200 esqueletos, quase todos masculinos.
O achado deu início
a um longo e árduo esforço de tradução dos
manuscritos por teólogos e cientistas de várias universidades
no mundo. Milhares deles estavam em pedaços minúsculos,
menores do que uma unha. "Hoje, 90% dos textos já foram transcritos",
diz o teólogo Geza Vermes, da Universidade de Oxford, que pesquisa
os manuscritos. O que já é suficiente para moldar uma imagem
mais precisa da história, da doutrina, da crença e dos hábitos
essênios, que ficaram séculos a fio esquecidos nas ruínas
daquele monastério.
O surgimento da doutrina
essênia aconteceu em tempos conturbados. Os judeus viveram sob dominação
de diversos povos estrangeiros desde 587 a.C., quando Jerusalém
foi devastada pelos babilônios, habitantes da atual região
do Iraque. Por volta do século II a.C., o domínio era exercido
pelos selêucidas, um povo grego que habitava a Síria. A cultura
helenista proliferava e a tradição hebraica sofria fortes
ameaças. Para recuperar o judaísmo, os israelitas acreditavam
na vinda do Messias que chegaria ao final dos tempos para exterminar os
infiéis e salvar os seguidores da Bíblia. A chegada do Salvador
poderia se dar a qualquer instante.
Os mais ortodoxos seguiam
tão à risca os preceitos religiosos e buscavam a ascese
e a pureza com tal fervor que ficavam chocados com os hábitos mundanos
dos gregos e a presença de leprosos, cegos, surdos e cachorros
passeando pela cidade e pelos templos. Entre eles estavam os essênios.
Um dia boa parte deles, liderados por um sacerdote, partiu para o Deserto
da Judéia (atual Israel) para orar, meditar e estudar as leis sagradas.
Longe, bem longe, de tudo o que eles consideravam impuro. Surgia assim
o monastério de Qumran, uma das primeiras comunidades monásticas
do Ocidente.
A região escolhida
para a construção do monastério é a de menor
altitude no planeta -400 metros abaixo do nível do mar. As chuvas
são raras e o mar é tão salgado que é impossível
mergulhar nele, pois a enorme densidade da água mantém o
banhista na superfície. Para prosperar, os bens individuais e as
tarefas foram divididos entre toda a comunidade e regras de disciplina
e de hierarquia foram instituídas. A presença de mulheres
em Qumran, por exemplo, era proibida. Transgressões eram duramente
punidas. A interpretação das leis e profecias cabia amestre
da justiça, o mesmo sacerdote que teria guiado os essênios
até Qumran. Ele era respeitado e cultuado por todos e logo virou
uma entidade mítica. O guardião, por sua vez, presidia as
refeições e decidia as questões a respeito da doutrina,
justiça e pureza. Essa figura inspirou a formação
da palavra grega "epis copus" (aquele que olha de cima), que
foi a origem de "bispo".
Os monges do deserto
tinham obsessão pela
pureza e pela disciplina
É
possível conhecer o dia-a-dia dos essênios a partir do legado
do historiador judeu Flávio Josefo (37-100). Aos 16 anos Josefo
recebeu lições de um mestre essênio, com quem viveu
durante três anos. Os membros da seita acordavam antes do nascer
do sol. Permaneciam em silencio e faziam suas preces até o momento
em que um mestre dividia as tarefas entre eles de acordo com a aptidão
de cada um. Trabalhavam durante 5 horas em atividades como o cultivo de
vegetais ou o estudo das Escrituras. Terminadas as tarefas, banhavam-se
em água fria e vestiam túnicas brancas. Comiam uma refeição
em absoluto silêncio, só quebrado pelas orações
recitadas pelo sacerdote no início e no fim. Retiravam então
a túnica branca, considerada sagrada, e retornavam ao trabalho
até o pôr-do-sol. Tomavam outro banho e jantavam com a mesma
cerimônia.
Os essênios tinham
com o solo uma relação de devoção. Josefo
conta que um dos rituais comuns deles consistia em cavar um buraco de
cerca de 30 centímetros de profundidade em um lugar isolado dentro
do qual se enterravam para relaxar e meditar.
Diferentemente dos demais
judeus, a comunidade usava um calendário solar de 364 dias, inspirado
no egípcio. O primeiro dia do ano e de cada mês caía
sempre um uma quarta-feira, porque de acordo com o Gênesis, o Sol
e a Lua foram criados no quarto dia. O calendário diferente trouxe
vários problemas para os essênios. Outros judeus poderiam
atacar o monastério no shabbath – o dia sagrado reservado
ao descanso, no qual era proibido qualquer esforço, inclusive o
de se defender.
A correta observação
das regras garantiria a salvação dos essênios quando
chegasse o apocalipse, que seria a vitória dos puros “filhos
da luz” contra os “filhos das trevas”. No mundo essênio,
aliás, tudo era dividido segundo uma visão maniqueísta
que tornava possível até mesmo determinar quantas porções
de luz e de escuridão cada um possuía. Um sectário
de dedos rechonchudos, coxas grossas e cheias de pêlos teria oito
porções na casa das trevas para uma de claridade. No mesmo
manuscrito, um outro membro obteve um placar mais favorável. Por
ter olhos negros e brilhantes, voz suave, dentes alinhados, dedos longos
e canelas lisas seu espírito foi condecorado com oito partes de
luz para uma de trevas. Para os essênios, a beleza do corpo também
era sinal de pureza espiritual.
Graças a essa organização
toda, Qumran produzia tudo de que precisava. A dieta era vegetariana.
Os essênios tinham um enorme respeito pela natureza. Nenhum homem
poderia sujar-se comendo qualquer criatura viva. A regra permitia uma
única exceção. Eles podiam comer peixe, desde que
fosse aberto vivo e tivesse seu sangue retirado. As refeições
eram frugais, com legumes, azeitonas, figos, tâmaras e, principalmente,
um tipo muito rústico de pão, que quase não levava
fermento. Eles possuíam pomares e hortos irrigados pela água
da chuva, que era recolhida em enormes cisternas e servia como bebida.
Além dela, as bebidas essênias se resumiam ao suco de frutas'
e "vinho novo", um extrato de uva levemente fermentado. No shabbath,
os sectários deveriam passar o dia inteiro em jejum. Os hábitos
alimentares frugais e a vida metódica dos essênios garantiam-lhes
uma vida saudável. Segundo Josefo, muitos deles teriam atingido
idade extraordinariamente avançada.
![](https://lh3.googleusercontent.com/blogger_img_proxy/AEn0k_swgycJIEjSRRFfRNKci7nlu4v4ZAB35ovm8MHj0CHngZDgWrXqb_IQLMOYFLvnZ5bi4JXaWR_BhBIJ5GBY0gr4HgTGpmwR95MIl_nP0lmTycD5x_vTpQ=s0-d)
As cavernas de Qumran, em Israel,
onde beduínos encontraram,
em 1947, os mais antigos textos bíblicos de que se tem notícia
A
água também era canalizada para os banhos rituais, que eles
tomavam duas vezes ao dia para se redimir dos pecados e das impurezas
do corpo. O ritual consistia em relatar todas as faltas e então
submergir. "Essa prática influenciou o batismo e a confissão
dos católicos", diz a historiadora Ruth Lespel, da Universidade
de São Paulo. Outro ponto em comum entre os essênios e o
catolicismo seria a figura de São João Batista, o profeta
que batizou Jesus Cristo. O santo promovia batismos no Rio Jordão
numa região próxima a Qumran.
Sua postura messiânica era muito próxima à dos essênios.
Há quem acredite que, quando foi batizado, Jesus teria visitado
o monastério e sido influenciado por sua doutrina.
Há outras relações
entre essênios e cristãos. "Existem passagens dos Manuscritos
do Mar Morto, aqueles encontrados em 1947 nas cavernas de Qumran, que
soam como as do evangelho cristão", afirma James Vanderkam,
da Universidade de Notre Dame, Estados Unidos. Traços da doutrina
dos primeiros seguidores de Jesus - como o elogio de uma vida humilde,
a proibição do divórcio e a invocação
a Deus como um pai - têm ressonância na fé de Qumran.
"É possível que essênios e cristãos tenham
entrado em contato", diz o cônego Celso Pedro da Silva, do
Mosteiro da Luz, em São Paulo.
Quanto a Jesus Cristo,
apesar das descobertas e polêmicas levantadas por Ouseley e Szekely,
não há nos manuscritos encontrados nas cavernas do Mar Morto
uma única menção a ele. É por isso que o maioria
dos pesquisadores duvida da teoria de que Jesus tenha se aproximado dos
essênios. "Não existe nenhuma evidência concreta
disso", diz o historiador Nachman Falbel, da USP Para o exegeta Valmor
da Silva, da Pontifícia Universidade Católica de Campinas,
Jesus pode ter recebido influência das mais diversas correntes do
judaísmo, inclusive deles. "Mas não dá para
garantir que ele tenha freqüentado uma de suas comunidades".
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEion4Byh-Qo1iNrdF8Obacub-fV_7I3PwrXgFzjGUqIUx9QNh4-Yzdc7K2fA58dKtwCUHPlvVXERLcXkb0GcAFSfJeQs7giOe8gR5iJpW8gnpBDWLGqf-0pRU8MztoAxHt4g49VBFuqNmk/s400/view01.JPG)
Afirmar
que Jesus se alimentava apenas de vegetais é ainda mais complicado.
"Eu duvido muito que Cristo tenha sido vegetariano, pois ele celebrou
a páscoa judaica, que envolve alimentos como ovo, patas de cordeiro
e frango", diz Vanderkam. Fernando Travi, líder da pequena
igreja essênia do Brasil, tem um ponto de vista oposto ao de Vanderkam.
"Cristo pregava o amor a todos os seres vivos e não matava
animais para aliviar a sua fome", afirma. Assim como ele, os seguidores
de Szekely e Ouseley duvidam da veracidade das passagens do Novo Testamento
em que Jesus se alimenta de carne. Eles acreditam que essas histórias
não passam de invenções criadas pelo apóstolo
Paulo, já na segunda metade do século I. A doutrina do vegetarianismo
não seria bem recebida pelos judeus, acostumados a fazer sacrifícios
e a comer carne, e Paulo teria modificado os evangelhos para tornar o
cristianismo mais popular. Um exemplo dessas alterações
estaria na passagem do Novo Testamento em que Jesus multiplica pães
e peixes para alimentar uma multidão. O Evangelho dos Doze Santos,
encontrado por Ouseley traz uma outra versão desse milagre, na
qual os peixes são substituídos por uvas.
No ano de 68 o monastério
de Qumran foi aniquilado numa devastadora investida do exército
romano que arrasou a Judéia e destruiu Jerusalém. O ataque
era dirigido principalmente aos judeus zelotes, que se insurgiram contra
o domínio romano. Qumran, que não era nenhuma fortaleza,
foi presa fácil para as legiões do César. Mas nem
todos os essênios morreram aí. Alguns fugiram para Massada
onde, aí sim, no ano de 73, descobriram o que é um final
trágico. O esconderijo, uma fortaleza zelote ao sul de Qumran,
localizada no alto de uma colina,
parecia impenetrável. Mas 15000
romanos fizeram um cerco que durou dois anos e metodicamente construíram
uma rampa de terra e areia para alcançar o topo da fortaleza. Quando
os soldados finalmente invadiram Massada tiveram uma surpresa: todos os
1000 rebeldes estavam mortos. Em um sorteio, os zelotes haviam escolhido
um grupo de soldados para assassinar todos os habitantes da fortaleza
e, em seguida, cometer suicídio. Eles preferiram morrer entre os
judeus a se tomar escravos dos romanos. Sobraram para contar a história
apenas duas mulheres e cinco crianças, que haviam se escondido
nos reservatórios de água. O episódio foi relatado
por Josefo e provou ser verdadeiro em 1965, quando arqueólogos
pesquisaram a região. Eles acharam as marcas dos oito acampamentos
romanos e peaços de cerâmica com inscrições
dos nomes dos zelotes, utilizados no dramático sorteio.
Filosofia enterrada na areia
Um pouco antes de um ataque romano destruir o monastério
de Qumran, os essênios esconderam seus manuscritos em
potes de cerâmica e os enterraram em cavernas
Segundo
Josefo, os essênios existiam em grande número em diversas
cidades da Judéia. Mas algumas variações da seita
podem ter ocupado regiões ainda mais distantes. Uma comunidade
egípcia do século 1, os terapeutas, possuía um modo
de vida semelhante ao da seita de Qumran e a mesma divisão entre
luz e trevas. Também é possível que ebionitas e nazarenos,
duas das primeiras seitas cristãs, sejam descendentes dos essênios.
Há quem acredite que os nazarenos formaram uma grande comunidade
em Monte Carmel, no norte da Israel atual, que seguia os ensinamentos
de Qumran, mas com algumas diferenças. As regras seriam muito próximas
daquelas encontradas nos escritos de Szekely e Ouseley. Ao contrário
de Qumran, eles não praticavam o celibato e até mesmo formavam
famílias. Fanáticos pelo princípio de amar todos
os seres vivos, eram muito mais rigorosos em relação ao
vegetarianismo: não comiam peixes nem matavam os vegetais para
comer (comiam folhas de alface, por exemplo, sem arrancar o pé!).
Para os essênios,
as
refeições devem ser uma
Comunhão com Deus
“Eles viviam em tendas,
que mudavam Del lugar freqüentemente, pois construções
permanentes matariam a relva”, afirma Fernando Travi. Ele acredita
que Jesus, apesar de ter passado por Qumran, viveu muito mais tempo em
Monte Carmel. A região em que teria existido essa comunidade está
próxima ao local em que Jesus nasceu e realizou muitos de seus
milagres. Afirma também que Cristo não era conhecido como
“Jesus de Nazaré”, mas sim como “Jesus, o Nazareno”.
Algumas dessas comunidades essênias existem, de certa forma, até
hoje.
Flavio Josefo
Historiador
judeu do século I, maior referência sobre os essênios
até a descoberta dos Manuscritos do Mar Morto.
A Filosofia Essênia
Szekely
pesquisou o pensamento dos essênios durante toda a vida. Uma de
suas principais obras é a tradução de um manuscrito
encontrado em 1785 pelo historiador francês Constantine Volney em
viagens pelo Egito e pela Síria. É um diálogo entre
Josefo e o mestre essênio Banus a respeito das leis da natureza.
Eis alguns trechos:
Bem - Tudo aquilo que preserva ou produz coisas para o mundo, como "o
cultivo dos campos, a fecundidade de uma mulher e a sabedoria de um professor".
Mal - O que causa a morte,
como a matança de animais. Por esse motivo, o sacrifício
de bichos, mesmo que para a alimentação, é condenável.
Justiça - O homem
deve ser justo porque na lei da natureza as penalidades são proporcionais
às infrações. Deve ser pacífico, tolerante
e caridoso com todos, "para ensinar aos homens como se tornarem melhores
e mais felizes".
Temperança - Sobriedade
e moderação das paixões são virtudes, pois
os vícios trazem muitos prejuízos à saúde.
Coragem - Ela é
essencial para "rejeitar a opressão, defender a vida e a liberdade".
Higiene - Uma outra virtude
essencial dos essênios é a limpeza, "para renovar o
ar, refrescar o sangue e abrir a mente à alegria".
Perdão - No caso
de as leis não serem cumpridas, a penitência é simples.
Banus afirma que, para se obter perdão, deve-se "fazer um
bem proporcional ao mal causado".
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhiF1alxNjov5zaFCvRrIFt2UDycUIQNGXWmDoc2EwraGl6-8Srv51zbKVd9QL8ySL6RYIsLIIJo3Tjts7HjLk72xk9fMQOYJrdZF3uxKE-tO2iFG7-3EggNTar68W59BMrU-OtdN42PC4/s400/1194227683.jpg+++orar.jpg)
Na
região sul do Iraque e do Irã, cerca de 38000 pessoas, os
mandeans, mantêm uma tradição muito semelhante à
doutrina essênia. Eles afirmam ser seguidores de João Batista
e praticam o batismo. Sua origem, no entanto, ainda não é
de todo compreendida.
No Ocidente, o essenismo
surgiu com a divulgação dos escritos de Szekely e Ouseley.
Na sua época, Szekely quase abandonou seus planos de difundir a
doutrina quando a tradução rigorosa e detalhada que fez
do segundo volume do Evangelho Essênio da Paz não contou
com a aprovação de um amigo seu, o escritor Aldous Huxley,
autor de Admirável Mundo Novo. "Isto está muito, muito
ruim", disse-lhe Huxley, "é até pior do que o
mais chato dos tratados enfadonhos dos escolásticos, que ninguém
lê hoje em dia". Szekely ficou sem fala. Huxley continuou:
"Faça-a literária, legível e atraente para os
leitores do século XX. Tenho certeza de que os essênios não
falavam uns com os outros em notas de pé de página".
A critica abalou Szekely e ele pôs de lado o trabalho durante muito
tempo. Mas, anos mais tarde, seguiu o conselho do amigo e reescreveu o
manuscrito inteiro em linguagem contemporânea, mais coloquial.
Foi
um sucesso. O livro, publicado em 1928, já foi traduzido para dezenas
de línguas e vendeu milhões de exemplares em todo o mundo.
Com o respaldo editorial, Szekely construiu em 1940 um spa no México
onde praticava tratamentos com base nas práticas essênias.
Cerca de 350.000 pessoas já se hospedaram no chamado Rancho La
Puerta nos seus sessenta anos de existência. Até hoje, muitas
pessoas vão ao lugar em busca de um estilo de vida baseado nos
ensinamentos de Szekely, que inclui exercícios, meditação
e, principalmente, dieta vegetariana.
A alimentação
possui um papel central na doutrina encontrada nos evangelhos de Szekely
e Ouseley. Ao afirmarem que Jesus era frugívero, ou seja, que ingeria
apenas alimentos que não significavam a morte de nenhum ser vivo,
como folhas e frutos, eles pregam que as refeições devem
ser um momento de compaixão e comunhão com Deus. O contato
com a natureza é essencial. Tanto que os novos essênios (veja
o quadro nesta página) possuem uma planta em todos os cômodos
da casa.
Os essênios permanecem
como um assunto vivo. Os pergaminhos e evangelhos que eles deixaram são
exaustivamente estudados por cientistas e religiosos do mundo inteiro.
Seus ensinamentos recrutam milhares de fiéis e, qualquer que seja
a relação que mantiveram com Cristo, deixaram, sem dúvida,
sua influência impressa no coração e na mente do cristianismo.
Os Essênios
Hoje
Em
1984, o teólogo e filósofo americano Abba Nazariah fundou
a Igreja Essênia de Cristo na cidade de Creswell, no Estado do Oregon,
Estados Unidos. Tudo começou em 1966, quando tinha apenas 8 anos
de idade. Naquele ano, Abba, que então se chamava David Owen, teria
recebido a visita de Jesus Cristo, que, em carne e osso, teria lhe passado
a missão de preparar a sua segunda vinda à Terra. Mais tarde,
com 17 anos, Owen teria encontrado um egípcio de nome Zadok pedindo
carona numa estrada da Califórnia, sentado na posição
de lótus-a mesma do Buda. Ele afirmava ser um essênio e acabou
ajudando Owen a formar a nova igreja.
Desde
então, Abba (o nome significa "pai" em aramaico) tem
professado sua teoria e recrutado muitos seguidores. Seus adeptos vivem
hoje de acordo com os ensinamentos contidos nas obras de Szekely e Ouseley.
Diferentemente dos antigos habitantes da Judéia, os fiéis
de hoje não habitam monastérios, mas, assim como os que
os precederam, estudam com rigor as escrituras sagradas e reservam o shabbath
ao descanso e às orações.
Os novos essênios
são despojados. Vestem-se de branco, usam barba longa e cabelos
que em alguns casos tocam o chão. Pregam uma vida saudável
que passa por uma dieta absolutamente vegetariana e por exercícios
espirituais. Fazem relaxamentos, meditações e preces. O
reverendo Abba Nazariah foi treinado em várias técnicas
de Yôga, com especial ênfase no que considera a mais holística
e compreensível de todas, a ioga essênia - uma união
de dezesseis modalidades da prática indiana. "A saúde
depende do amor por todos os seres. Inclusive pelos animais", diz
o líder dos essênios americanos.
Segundo a Igreja Essênia
de Cristo, depois de dez anos de constante aperfeiçoamento, os
féis se tornam aptos a receber a visita de Jesus. Eles também
acreditam em reencarnação. Para o psicólogo paulista
Fernando Travi, líder da igreja essênia no Brasil, "todas
as pessoas iniciadas estão aptas a conhecer suas vidas passadas".
As atividades no Brasil
são mais modestas. Elas se resumem a reuniões semanais para
discutir a doutrina essênia e formas de melhorar a saúde
de acordo com os evangelhos de Ouseley e Szekely. "Os essênios
ensinam a nos relacionarmos melhor com a natureza e com o Cosmo",
afirma Travi.
Artigo retirado da revista
Super Interessante / agosto de 2000
http://dalvaamaral.blogspot.pt